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Voluntariamente autista, sociável com trouxas, fluência em melancolicês. Não tem dom de se expressar pela fonética, mas ama a escrita mesmo sem saber juntar a multidão de letras que seguem suas células. Apenas uma alma muda na imensidão de vozes.

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terça-feira, 20 de dezembro de 2016


I

Dói-me o coração, e aflige meus sentidos
Um torpor de sono, como se eu tivesse
Bebido da cicuta ou esgotado há um só instante
Um lânguido narcótico e descido para o Lete:
Não porque eu inveje a tua boa sorte,
Porém porque me alegro ao ver-te assim feliz,
Que tu, arbórea Dríade das asas leves,
Em nesga melodiosa
De um verdor de faias e de sombras incontáveis
A plena e fácil voz celebras o verão.

II

Oh! um trago de vinho! que se tenha refrescado
Longa idade no seio da profunda terra!
Que saiba a Flora e a campos verdejantes,
A dança, a canto provençal e a júbilo queimado pelo sol!
Oh! uma copa que transborde o quente Sul,
Cheia da verdadeira, da Hipocrene rubra,
Tendo a piscar nas bordas bolhas como pérolas
E uma boca de púrpura tingida!
Que eu pudesse bebê-la e sem ser visto abandonasse o
                                                mundo,
E contigo esvaecesse na floresta escura!

III

Esvair-me bem longe, dissolver-me e em tudo me olvidar
Daquilo que entre as folhas tu jamais sentiste,
A fadiga, a febre e a inquietação,
Aqui, onde os homens sentam para ouvir gemidos uns 
                                          dos outros,
Onde a paralisia faz a tremer uns poucos, tristes, últimos,
                                           cabelos cinza,
E a juventude empalidece e morre espectralmente
                                            macilenta;
Onde apenas pensar é encher-se de tristeza
E de desesperança de olhos plúmbeos;
Onde à beleza não é dado conversar olhos brilhantes,
Nem, além do amanhã, a um novo amor languir por eles.

IV

Ao longe, ao longe! Para ti quero voar,
Não no carro de Baco e seus leopardos,
Porém nas asas invisíveis da Poesia,
Embora o cérebro, pesado, hesite e me retarde.
Já estou contigo! meiga é a noite,
E talvez em seu trono esteja a Lua, essa rainha,
Tendo a enxamear-lhe em torno as suas fadas estelares.
Mas aqui não há luz,
Senão aquela que dos céus com as brisas é soprada
Por entre sombras verdejantes e caminhos tortos e
                                             musgosos.

V

Não posso ver que flores a meus pés se encontram,
Nem que perfume suave paira sobre os ramos,
Mas adivinho, em treva embalsamada, todos os aromas
Com que o mês favorável dota a relva,
A moita e as árvores frutíferas do mato;
O branco pilriteiro e a rosa brava pastoril;
A violeta que logo murcha oculta sob as folhas;
E de meados de maio a primogênita,
A rosa almiscarada que reponta cheia de orvalhado vinho,
Pouso de moscas murmurante pelas noites estivais.

VI

Às escuras escuto; e muitas vezes,
Quase que enamorado da tranquila Morte,
Doces nomes chamei-lhe em versos meditados
Para que dissipasse no ar o meu alento;
Agora como nunca eu acho que morrer é uma riqueza:
Findar a meia noite sem nenhuma dor,
Enquanto em torno a ti vais derramando a tua alma
Com todo esse arrebatamento!
Cantarias ainda; e em vão teria ouvidos eu,
Para teu alto réquiem transformado em terra e grama.

VII

Tu não nascestes para a morte, Pássaro imortal!
Não pisam sobre ti as gerações famintas,
A voz que ouço esta noite fugitiva foi ouvida
Em velhos dias por Imperador e por campônio;
Talvez o mesmo canto que encontrou caminho
No triste coração de Rute, quando, ansiando pelo lar,
Ela ficou chorando em meio ao trigo do estrangeiro;
O mesmo que encantou, vezes e vezes,
Janelas mágicas abertas sobre a espuma
De mares perigosos, num país de fadas já perdido!

VIII

Perdido! Essa palavra é como um sino
Que dobra para que de ti eu volte à minha solidão!
Adeus! A fantasia não nos pode iludir tanto
Como se diz, fada enganosa.
Adeus! adeus! tua plangente antífona se esvai
Além dos prados em redor, por sobre o riacho quieto,
Subindo a encosta da colina; e agora entrou a fundo
Nas clareiras do vale próximo;
Foi isso uma visão, ou um sonho que sonhei desperto?
A música fugiu: - Estou desperto ou estarei dormindo?



John Keats ♥ 
                                (traduzido por Péricles Eugênio).

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